Como já comentei no Post 08 minha mãe era uma costureira de mão cheia. Todas as sextas-feiras, ia com meu pai ao centro da cidade para comprar aviamentos. Como ela era apressada, descia do carro antes e já ia adiantando as compras enquanto meu pai buscava um lugar para estacionar.
Numa sexta dessas, minha mãe fez a passagem dela por meio de um acidente. Ao atravessar na faixa de pedestre, um motociclista percebeu que iria atingi-la e conseguiu afasta-la com o braço para evitar a colisão. Por conta disso, ela caiu de costas no chão e, como a cabeça é mais pesada, bateu no chão causando um traumatismo craniano que causou sua morte.
Meu pai estava estacionando o carro umas quadras longe da avenida onde o acidente aconteceu e não havia nada que ele pudesse fazer.
Culpado ou inocente?
Contudo, no dia do velório, meu pai me disse cheio de culpa:
– Se ela me ouvisse, nada disso teria acontecido.
Apesar da nossa tristeza, eu ri. Não consegui me segurar. Meu pai ficou bravo e perguntou do que eu estava rindo. Respondi:
– Se ela escutasse você, ela seria qualquer outra mulher no mundo, menos a mamãe.
Era verdade. Minha mãe nasceu, viveu e morreu do jeito dela. Nunca escutou ninguém. Nem mesmo meu pai. O efeito dessa conversa foi ótimo. A culpa sumiu. Veja, não havia nada que meu pai pudesse fazer, mas ele se sentia triste e culpado. A tristeza continuou, mas sem culpa, mais leve.
Fica o convite de aceitarmos que temos pouco ou nenhum controle sobre a maioria dos fatos da nossa vida. Isso pode tornar tudo mais leve.
Até amanhã.
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